Dom Genival Saraiva
Bispo emérito de Palmares – PE
O profeta Isaías, no seu tempo, via o discípulo como um aprendiz de Deus: “O Senhor Deus me deu uma língua de discípulo para que eu saiba ajudar com uma palavra quem está cansado. Toda manhã ele me desperta e abre meus ouvidos para que eu ouça como um discípulo. (Is 50,4)” “Todos os teus filhos serão discípulos do Senhor e grande será a sua paz. (Is 54,13)” Deste texto profético, fica o ensinamento: “O discipulado era uma relação mais de pai e filho do que de instrutor e aluno.” Antes da sua Ascensão, Jesus confia aos apóstolos a missão de suscitar discípulos seus em todas as nações: “‘Foi-me dada toda a autoridade, no céu e na terra. Ide, pois, e fazei discípulos todos os povos, batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo.’(Mt 28,18)”. A respeito da condição de discípulo, escreve um autor: “Discípulo é todo aquele que quer ser ensinado, se deixa formar e se põe, por isso, à escuta do mestre. Ele virá em seu auxílio de maneira imperceptível quase sempre e de forma mais sentida quando entender que assim é melhor para o amadurecimento da fé do discípulo. Este deve aprender a esperar na fé, precisamente.”
No mês de agosto, a Igreja Católica no Brasil educa os fiéis para um olhar sobre os discípulos e discípulas de Cristo e neles estimula a prática da oração, em vista, particularmente, da compreensão da dimensão vocacional de sua vida e do empenho de vivenciá-la, com espírito evangélico. Trata-se de uma iniciativa pastoral que visa aprofundar a visão sobre a vida e a vocação, com a iluminação divina. Substancialmente, os caminhos da vocação colocam a pessoa numa tríplice perspectiva de serviço a Deus e ao próximo: vocação ao ministério ordenado (diaconado, presbiterado, episcopado), vocação à vida consagrada e vocação à vida conjugal/familiar. Nessa leitura da vocação, é preciso ter presente essa premissa, esse aspecto distintivo: Deus está sempre na sua origem; no entanto, nessa leitura, como ensina São Paulo VI, há “dois modos distintos, maravilhosos e convergentes: um interior, o da graça, o do Espírito Santo, o inefável do fascínio interior que a ‘voz silenciosa’ e poderosa do Senhor exerce nas insondáveis profundezas da alma humana; e um exterior, humano, sensível, social, jurídico, concreto, o do ministro qualificado da Palavra de Deus, o do Apóstolo, o da Hierarquia, instrumento indispensável, instituído e ordenado por Cristo, como veículo encarregado de traduzir em linguagem perceptível a mensagem do verbo e do preceito divino.” Assim, notadamente em relação à vocação ao ministério ordenado e à vida consagrada, a sua percepção é feita à luz da fé, em espírito de oração; portanto, numa atitude de escuta orante de Deus. Em muitos casos, isso acontece num estado de penumbra da inteligência, numa situação de sombra da razão, numa tênue compreensão do amor de Deus na vida do vocacionado
A origem divina da vocação não dispensa a participação do vocacionado, com sua oração de discípulo ou discípula, e da comunidade, com sua oração de súplica, como ensina Jesus: “‘A colheita é grande, mas os trabalhadores são poucos. Pedi, pois, ao Senhor da colheita que envie trabalhadores para sua colheita.’ (Mt 9,38)” Tampouco dispensa do uso responsável de sua liberdade o vocacionado ou quem deu sua resposta ao amor de Deus pela via sacramental ou mediante sua consagração: “Há uma coisa que o amor certamente não faz: controlar a liberdade dos homens, substituir-se a ela e manipular os acontecimentos da história. Quando interfere na vida dos homens, Deus fá-lo para libertar ou responsabilizar. Nunca ao contrário. Só Deus sabe se o remédio imediato liberta ou desresponsabiliza.”
Por sua natureza, a vocação ao ministério ordenado, à vida consagrada e à vida conjugal/familiar encerra, necessariamente, a dimensão do serviço, como ensinou e viveu o próprio Jesus: “Quem quiser ser o maior, no meio de vós, seja aquele que serve, e quem ser o primeiro, no meio de vós, seja o servo de todos; pois o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar sua vida em resgate por muitos. (Mc 10,43-45)”
Fonte: CNBB