Palmares, 25 de abril de 2024

Modo de ser, viver, agir

13 de fevereiro de 2022   .    Visualizações: 1232   .    Notícias da Diocese

Dom Genival Saraiva de França.
Bispo Emérito de Palmares (PE). 

A natureza, a vida das pessoas e o comportamento da coletividade regem-se por leis e disposições normativas que levam em consideração a regularidade ou revelam uma anormalidade no seu “modus essendi”, “modus vivendi”, “modus agendi”. Assim, o espírito de observação e a ciência constatam que fenômenos da natureza regem-se pela regularidade de suas leis, como a “lei da gravidade” – “uma força exercida pela Terra que puxa (atrai) todos os objetos em sua direção” e o “instinto de conservação” – “Todos o possuem, qualquer que seja o seu grau de inteligência; nuns é puramente mecânico e noutros é racional.” Diferentemente de quem segue o ensinamento da Revelação que reconhece Deus como Criador do mundo, o conhecimento científico, com seu foco filosófico ou experimental, tem como referência a descoberta das causas de tudo que existe. Dessa maneira, por óticas e meios próprios, o conhecimento empírico e o cientifico chegam ao conhecimento de fenômenos no comportamento da natureza, por razões óbvias, no tocante, por exemplo, à regularidade das chuvas, coisa que acontecia, com precisão constatada, em passado não muito distante. A isso estava associada a experiência prática do agricultor sobre o período adequado do plantio e da colheita. Hoje, com os meios de que dispõe, o agronegócio adota outras medidas, como a irrigação, em vista dos resultados. Atualmente, a anormalidade no comportamento da natureza é constatada por todos, provocada pelas nefastas intervenções humanas e empresarias, cujos efeitos estão registrados nos ares e mares do planeta terra. Nesse sentido, cabe a pergunta: a seca no Pantanal Mato-Grossense e no Rio Grande do Sul é obra do acaso ou consequência da agressão à natureza, aqui e alhures? 

Com sua peculiaridade, a vida social também reflete o fenômeno da regularidade, em patamares que têm a marca do tempo. Assim, há muitos ou há alguns anos, não se conhecia a face da violência social e, as pessoas viviam o clima de harmonia na convivência. Em relação a isso, a anormalidade reflete a falta de oferta de serviços públicos indispensáveis na área da saúde, educação, segurança, trabalho, entre outros. Embora registradas com rosto próprio nas diversas nações, mesmo com as limitações do tempo, as epidemias encontravam soluções, em razão dos cuidados das pessoas e das intervenções das ações governamentais. As pandemias, por sua vez, mesmo circunscritas a um universo menor de nações, causaram muitas mortes, deixaram muitas marcas dolorosas. Por “n” fatores, a pandemia do coronavírus, com as variantes identificadas, tem sua peculiaridade, em termos de rapidez na contaminação, do grau de letalidade, das sequelas físicas e psicológicas em pessoas recuperadas e das consequências sociais e econômicas que têm abrangência global.  

A realidade da pandemia tem sua configuração no Brasil. Essas três instâncias – indivíduos, coletividade e poderes públicos – tinham um lugar identificado diante do que, positivamente, deveriam assumir no processo de enfrentamento e busca de superação da pandemia. Essa expectativa de êxito não alcançou o percentual necessário, haja vista o atual mapa avermelhado do Brasil. É real o descompromisso com a vida, considerando a não observância coletiva das medidas preventivas, – distanciamento interpessoal/aglomeração social, uso de máscara e vacinação – que se reflete nas estatísticas do elevado número de contaminações, mais de 27.000.000 de casos, do inaceitável número de mortes, acima de 635.000 pessoas e de grande parte da população vacinável ainda não imunizada. A divulgação de Fake News e a mentalidade fundamentalista são causas da recusa de vacinação por parte de pessoas que não têm o necessário nível de conhecimento e de outras que têm “notório saber” sobre o assunto. No tocante ao grau de responsabilidade dessas pessoas, o Catecismo da Igreja Católica distingue, conforme o caso: trata-se de “ignorância” ou de “juízos errôneos”? Entenda-se: “Ignorância é a falta de conhecimento devido.” “Muitas vezes esta ignorância pode ser imputada à responsabilidade pessoal. É o que acontece ‘quando o homem não se preocupa suficientemente com a procura da verdade e do bem, e a consciência pouco a pouco, pelo hábito do pecado, se torna quase obcecada’. Neste caso, a pessoa é culpada pelo mal que comete.” (CIC n.1791) Essa consciência “obcecada” em não procurar a verdade e o bem responsabiliza a pessoa. “A ignorância é superável quando você tem os meios suficientes para sair dela”. A ignorância “chamada crassa ou supina”, típica de pessoas que, mesmo tendo recursos e dispondo de meios, agem sem a consciência ética de sua responsabilidade, qualquer que seja o seu campo de ação, contrariando, assim, os “princípios e regras” da deontologia que regulam “o exercício da profissão, e de acordo com o Código de Ética de sua categoria.” Quando essas pessoas atuam na área da saúde, considerando-se a natureza de sua profissão, as consequências de sua conduta são lidas na crônica das angústias das pessoas e dos sofrimentos da população. Essa é uma anormalidade que, tristemente, vai se incorporando ao modo de ser, viver e agir de muitas pessoas na sociedade. 


Fonte e Foto: CNBB

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