Palmares, 23 de dezembro de 2024

Retiro Quaresmal 2020/38 “Felizes os que se abrigam no Senhor!” (Sl 2,12)

09 de abril de 2020   .    Visualizações: 524   .    Palavra do Bispo

Quinta-feira Santa

Meditação XXXVII: Sem beleza nem formosura, não fizemos caso Dele

Reze o Salmo 119/113-120

Agora, medite e reze Is 52,13 – 53,12, tendo diante dos olhos Jesus Cristo, o Homem de Dores que nos salvou.

1. Este é o último e mais impressionante dos quatro cânticos do Servo Sofredor. De tão impressionante e de tanto nos recordar as dores do Senhor Jesus, muitos o chamam de “a Paixão segundo Isaías”. Na verdade, estes poemas – sobretudo este último – ajudaram sobremaneira os cristãos a compreenderem o sentido dos padecimentos e mortes do Senhor. Então, com veneração e religioso respeito, vamos acompanhar as palavras de Isaías que, em última análise, são palavras do próprio Deus!

2. Leia os vv. 13-15. Aí, o Senhor Deus apresenta o Seu Servo nas Suas dores. O cântico todo será uma longa explicação das dores e da morte do Servo: Sua paixão será motivo da realização do desígnio do Senhor: a salvação de Israel e de toda a humanidade. Por isso mesmo, este primeiro versículo é de triunfo e glória: o Servo vai prosperar, será elevado no mais alto. Compare com Fl 2,9-11. Observe o contraste extremo: do mesmo modo que os povos e os grandes deste mundo ficaram pasmos, sem compreender o sofrimento desse Servo desfigurado – “Ele não tinha mais figura humana e Sua aparência não era mais a de homem”–, do mesmo modo, o mundo permanecerá silencioso e estupefato diante da exaltação do Servo. Observe que é o caminho cristão: da maior humilhação à maior exaltação (cf. Ef 4,10). Veja, por exemplo, o Sl 22/21. Este foi o salmo que o Senhor rezou na Cruz. Observe como é uma oração de profunda dor, mas também de certíssima esperança no triunfo final: “Quanto a Mim, sou verme, não homem. Eu Me derramo como água e Meus ossos todos se desconjuntam” (vv. 7.15); “de Ti vem o Meu louvor na grande assembleia, cumprirei Meus votos frente àqueles que O temem. E Eu vivo para Ele, Minha descendência o servirá!” (vv. 23.26.30) É o mesmo espírito da pergunta do Eclesiástico: “Quem confiou no Senhor e ficou desiludido? Ou quem perseverou no Seu temor e foi abandonado? Ou quem clamou por Ele e Ele o desprezou?” (2,10/11). Eis! Nunca duvidemos: É bom confiar no Senhor! É bom esperar sempre no Senhor! O Nome Dele é Fidelidade, o Nome Dele é Amor que ressuscita!

3. Agora, entrando no capítulo 53, os vv. 1-11a descrevem de modo impressionante e comovente a dor do Servo. Logo de início, o v. 1 reconhece que foi o “Braço do Senhor” que agiu em toda esta dor e ignominia do Servo! Daí a tremenda admiração! Como é possível? Como Deus permitiu isto ao Seu Servo fiel? Como é possível que o Senhor permita deste modo o sofrimento, a humilhação, o abandono, a violência e a morte vergonhosa de Quem Lhe é fiel? Mais ainda: como é possível que o Senhor utilize tal caminho para o seu desígnio de salvação? Pensando bem, trata-se de questões que ainda hoje vêm ao nosso coração. Reze o Sl 10/9,22-39. Como é difícil enxergar a presença de Deus na dor! Como é penoso proclamar no sofrimento e na e humilhação que o Senhor Deus é presença de amor!

4. O cântico começa, então, a descrever os tremendos sofrimentos físicos e morais do Servo:

=> Ele era pequeno e frágil aos olhos do mundo, mergulhado numa existência precária e sofrida (cf. vv. 2-3);

=> Sua situação humilhante tinha um sentido reparador e vicário, ou seja, de representar, tomar o lugar: “Eram nossos sofrimentos que Ele levava sobre Si, nossas dores que Ele carregava” (v. 4). Esta afirmação é importantíssima: pela primeira vez nas Escrituras se afirma de modo explícito a ideia de um sofrimento tomado para salvar a outros! Leia atentamente os vv. 5-7.8c! Esta será uma chave essencial para os cristãos compreenderem o sentido do que aconteceu com Jesus nosso Senhor!

=> O v. 5 afirma claramente que o castigo do Servo nos traz o shalom de Deus, isto é, a amizade como Senhor, a comunhão com o Eterno, em uma palavra, a salvação! Com Suas dores, o Servo nos reconciliou com Deus!

=> No v. 6 afirma-se de modo impressionante que “o Senhor fez cair sobre Ele a iniquidade de todos nós!” Veja os vv. 4.6.10-12. Observe que estas ideias são exatamente as mesmas presentes no Novo Testamento ao descrever o sentido da Paixão do Senhor!

=> No v. 7 aparece, de modo comovente, a mansidão e paciência do Servo, comparado, agora, a um cordeiro pacífico. Aqui é necessário recordar que o cordeiro e a ovelha são animais típicos para os sacrifícios a Deus no Templo. O sofrimento do Servo é um sacrifício a Deus! Ainda neste versículo aparece a importante afirmação que o Servo entregou-Se livremente: “livremente humilhou-Se!” Leia Jo 10,17-18.

=> Vale a pena insistir na afirmação: “Ferido pela transgressão do Seu Povo!” (v. 8).

=> O v. 9 é impressionante: insiste na inocência radical do Servo e, ao mesmo tempo, na Sua solidariedade com os pecadores. Aqui aparecem os ímpios e os ricos, quase como sinônimos, enquanto tendem a ser descrentes, violentos, devassos, enganadores (cf. v 12). Leia 2Cor 5,21. Nesta solidariedade, assumindo os pecados do mundo, o Servo redime o mundo inteiro! (cf. ainda o v. 12)

5. Agora os vv. 10-12. Aqui aparece o triunfo final do Servo! Porque foi fiel ao Senhor Deus até a morte e para além da morte, o Eterno O glorificou e deu-Lhe uma posteridade! Vejamos:

=> Aparece claramente, com total transparência, a ideia do “sacrifício expiatório” (v. 10)! Nunca é demais repetir: esta ideia de alguém oferecer a vida para expiar os pecados de outros e, sobretudo, do Povo de Israel e até da humanidade, simplesmente não existia ideia no Antigo Testamento! É uma ideia central, vital, para o cristianismo!

=> Ainda no v. 10, duas ideias preciosas: (a) a oferta do Servo faz parte do misterioso desígnio do Senhor Deus! Leia Jo 3,16; Rm 8,31-34; 1Pd 2,21-25. (b) para além da entrega até a morte, o Servo terá uma descendência, uma multidão ser-lhe-á dada como herança e plenitude!

=> Finalmente, o triunfo, nos vv. 11-12: depois do fatigoso trabalho do sofrimento até a escura morte, o gozo pleno e farto da luz; depois do conhecimento de Deus, isto é, do reconhecimento do senhorio do Altíssimo, o fruto de ter salvo, justificado uma multidão! Outra ideia maravilhosa: o um que salva os muitos!

=> Por último, o Servo torna-Se o eterno intercessor, mais que Moisés, que Samuel, que Jeremias, os grandes intercessores de Israel! Pois somente o Servo entregou a própria vida numa doação total: “Tendo amado os Seus que estavam no mundo, amou-os até o fim” (Jo 13,1).

6. Para rezar, nada melhor que reler todo este canto com o conselho do Autor da Epístola aos Hebreus no coração: “Assim, meus santos irmãos e companheiros da vocação celeste, considerai atentamente Jesus, o Apóstolo e Sumo Sacerdote da nossa profissão de fé!” (3,1).

Dom Henrique Soares da Costa
Bispo de Palmares


Fonte: Visão Cristã