Meditação IX: Orar sem jamais desfalecer
Reze o Salmo 119/118,65-72
Como lectio divina, releia ainda uma vez Tb 3,1-6.11-17. Leia também Br 2,11 – 3,8.
1. Nestes textos das Escrituras agora relidos e lidos, testemunhamos como aquele que, de verdade, crê no Senhor Deus, reza, e reza com sua vida, como ela é: feita de alegrias, tristezas, provações, tremenda escuridão e incontido júbilo. Como diz o Apóstolo: “Orai sem cessar!” (1Ts 5,17)e “orai em todo tempo, no Espírito” (Ef 6,18) e, mais que ele, o próprio Salvador no incute: “a necessidade de orar sempre, sem jamais esmorecer” (Lc 18,1).
2. Mas, como rezar? Vejamos antes de tudo uma classificação bem simples dos tipos de oração nos seus dois grandes modos: oração vocal e oração mental. A oração vocal é qualquer oração que rezamos decorada. Por exemplo: mesmo quando rezamos somente com a mente o Pai-nosso ou a Ave-Maria, estamos fazendo oração vocal; quando rezamos um salmo também estamos fazendo oração vocal. É o caso ainda das jaculatórias, aquelas orações curtinhas que nos fazem permanecer durante o dia todo na presença de Deus. Quanto à oração mental, é a oração espontânea, aquela que brota do nosso afeto e da nossa imaginação com total criatividade. A vantagem da oração mental é que empenha mais a nossa atenção e o nosso afeto, além de nos fazer rezar nossas preocupações e situações existenciais. Quanto à oração vocal, tem a grande vantagem de nos manter na presença de Deus seja em que situação emocional estejamos. Tristes ou alegres, atentos ou desatentos, devotos ou áridos, a oração vocal tira-nos de nós mesmos e faz-nos estar na presença de Deus. Além disto, educa nossos sentimentos e afetos, pois as palavras ditas vocalmente, condicionam o nosso interior. Isso é muito importante, porque ensina-nos que o centro da nossa oração não somos nós com nossos sentimentos e preocupações, mas unicamente o Senhor, que deve ser amado e buscado acima de tudo. Além do mais, a oração vocal livra-nos do subjetivismo e da necessidade de estar sempre inventando palavras e assuntos para rezar. Neste sentido, a melhor oração vocal são os textos da Sagrada Escritura. Isso mesmo: rezar com a Bíblia, rezar repetindo a Palavra de Deus, sobretudo os salmos. Quem reza a Liturgia das Horas pode experimentar de modo privilegiado esta realidade. Basta recordar que quando os judeus dizem: “Eu medito nas Tuas palavras” (cf. Sl 1,2; 119/118,97), estão querendo dizer: “Eu repito com os lábios, decoradamente, as Tuas palavras”. Para a Sagrada Escritura, meditar é repetir a Palavra de Deus, ruminando-a com os lábios, o coração, a mente e o afeto.
3. Quanto aos movimentos interiores, a oração pode ser de ação de graças, de súplica, de intercessão, de louvor, de pedido de perdão. Em todas elas, o importante é que nos abramos para o Senhor, reconhecendo nossa incapacidade de gerenciar nossa vida sozinhos, como se nossa existência fosse nossa de modo absoluto. Quem reza mantém-se na presença de Deus; quem reza vai aprendendo a deixar que Deus seja Deus na sua vida.
4. Finalmente, de modo concreto, como rezar? Reze diariamente; reze o dia todo! Como? Diariamente. Tenha, durante seu dia, um momento de cerca de vinte minutos, meia hora, para a oração. Comece acalmando seu corpo e seus pensamentos. Peça ao Santo Espírito que sustente sua oração. Tome a Palavra de Deus. Pode ser o Evangelho do dia, um salmo, ou outro texto que você escolher. Leia-o com calma, devotamente, com tranquilidade. Enquanto lê, se uma palavra o tocou, pare ali, repita aquela Palavra, saboreie-a. Acontecerá frequentemente que virão afetos, sentimentos, palavras nos seus lábios. Deixe que venham! Você está rezando! Deus lhe falou e você está respondendo! Quando forem passando as palavras e os afetos, continue a leitura do texto sagrado até terminar. Se quiser, faça mais um pouco de oração e termine sempre com um Pai-nosso e uma Ave-Maria. É importante que deixemos sempre que a Escritura questione a nossa vida, comprometendo-nos com um processo de constante conversão ao Senhor e aos irmãos. A leitura orante das Escrituras deve sempre nos fazer colocar a Santa Palavra do Senhor na nossa vida concreta: O que esta Palavra me diz? O que pede de mim? Que devo fazer para vivê-la verdadeiramente?
Caso você tenha lido e não tenha sentido nada, nada o tenha empolgado, não há problema; não se preocupe. Terminada a leitura do Texto sagrado, simplesmente peça ao Senhor, com poucas palavras, que a Sua Palavra dê fruto no seu coração e no chão da sua vida. Se você passar por momentos tão áridos e dispersos que não conseguir rezar de modo algum, pegue sua Bíblia, tome um salmo e vá copiando-o num caderno. Você está rezando: com as mãos, com os olhos, com a atenção e com o desejo sincero de agradar a Deus. Nunca esqueça que o valor da oração não está nos sentimentos, mas no desejo sincero de agradar a Deus e ser-Lhe fiel.
5. Além desse momento privilegiado, é importante passar o dia na presença de Deus. Como fazer? Existem várias possibilidades. Um excelente modo é a reza do terço. Pode rezá-lo aos poucos, durante todo o dia, num momento um mistério, num outro momento, outro mistério. Assim você vai atravessando o seu dia na cadência dessa oração tão cara aos cristãos, com a Virgem Maria, a Mãe de Jesus. Não se preocupe muito em dizer com atenção cada Ave-Maria. O importante é dizê-las de modo cadenciado, para que permaneça aquele clima de paz, que o irá colocando na presença de Deus. Não é a palavra em si o que mais interessa, mas o estar na presença de Deus: como dizia Santa Teresa, não se trata de falar muito, mas de amar muito! Além do terço, pode-se usar também as jaculatórias (que hoje, erradamente, chamam de mantra), isto é, frases curtas decoradas, que tantas vezes podemos repetir durante o dia. Por exemplo: “Meu Jesus, misericórdia!” ou “Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, tem piedade de mim” ou “Ó Maria concebida sem pecado, rogai por nós, que recorremos a vós!” São orações vocais, simples, mas que têm um efeito enorme: mantém-nos na presença de Deus.
6. Finalmente, a oração mais importante e indispensável para o cristão: a oração litúrgica por excelência, isto é, a Santa Missa, Sacrifício eucarístico do Cristo Jesus. Ali, o próprio Salvador nosso nos une à Sua oração de modo eminente. É a Igreja reunida em santa assembleia que é convocada para ouvir a Palavra e dizer “Amém” e, depois, celebrar o Sacrifício eucarístico da Ceia do Senhor. Aqui, a nossa vida de oração chega ao máximo. Já não somos nós quem rezamos, mas o próprio Cristo, que na força do Espírito, nos eleva ao Pai.
7. Para concluir o que meditamos sobre a oração, reze o belíssimo Sl 144/145, louvando o Senhor! Vale a pena ainda levar em conta as belas palavras da oração de Sara segundo a tradução da Vulgata: “Teus desígnios, Senhor, não estão ao alcance do homem, mas todo aquele que Te serve sabe que, se esteve na provação, será coroado; se esteve na tribulação, será libertado; se passou pela correção, terá acesso à Tua misericórdia. Pois não Te comprazes em nossa perda, mas depois da tempestade trazes a bonança e, depois das lágrimas e do pranto, infundes alegria…” (Tb 3,20-22 – segundo o texto da Vulgata).
Dom Henrique Soares da Costa
Bispo de Palmares
Fonte: Visão Cristã