É convicção inerente ao cristianismo e, portanto, absolutamente irrenunciável que o cristianismo é a única religião verdadeira (religio vera). Somente nela Deus revelou-Se plenamente. Toda a história do Povo de Israel foi revelação autêntica e verdadeira do Senhor Deus, preparando a plenitude dos tempos, quando veio o Santo Messias, Jesus Cristo, Verbo do Pai, Deus gerado e vindo de Deus, Luz gerada e vinda da Luz, através de Quem e para Quem tudo foi criado no Céu e na terra. Neste sentido, a situação do judaísmo é única: ele não é propriamente uma religião falsa, mas incompleta, como um botão que não chegou a ser flor, como um fruto que não chegou a amadurecer, como uma promessa que não consegue enxergar o cumprimento. Isto acontecerá, com a graça de Deus, quando o Messias, nosso Senhor, Se manifestar em glória, na Sua gloriosa Parusia, que esperamos e desejamos. Neste sentido coincidimos com os judeus, que também esperam o Messias. Nós já sabemos quem Ele é: é Jesus, nosso Senhor; eles saberão ao final; saberão e reconhecê-Lo-ão! Sobre isto, leia-se Rm 9 – 11. Um cristão não pode, portanto, avaliar o judaísmo como uma religião falsa: ele nasceu da vontade de Deus em vista de Cristo; misteriosamente este propósito divino persiste…
Todas as outras religiões são, fundamentalmente, feitos humanos, realidades plasmadas pelo homem, dele se originando. Em si, têm um aspecto fundamental muitíssimo positivo: são expressão da irrefreável busca de Deus por parte do homem, são expressão da saudade do Infinito que habita o coração humano. Em todas as religiões pagãs o homem procura, às apalpadelas, o Deus escondido. E esta sede, esta procura, este desejo visceral do coração humano é pelo Senhor Deus desejada e foi pelo Senhor Deus colocada no mais íntimo dos filhos de Adão. Por isso mesmo, todas as religiões têm elementos positivos e sementes de verdade e de bem, que devemos reconhecer e pelos quais damos graças a Deus, pois são até preparação para o Cristo (preparatio evangelica). No entanto – e o Concílio Vaticano II é claríssimo nisto -, possuem também graves lacunas e até mesmo erros sérios. Nunca esqueçamos: nenhuma religião pagã é revelada por Deus! É uma procura de baixo para cima: é um desejo do homem, é uma frágil palavra do homem sobre Deus. E, por isso mesmo, provisória, incompleta e, muitas vezes, errônea.
O dever dos cristãos é anunciar claramente Jesus, o Senhor, a todos os povos, a todos os homens, para que conheçam a salvação que Deus nos oferece no Seu bendito Filho e, assim, todos se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade (cf. 1Tm 2,4), que é unicamente Jesus Cristo. A Igreja e os cristãos não podem se eximir desse testemunho sob nenhum pretexto: “Ide e fazei que todas as nações se tornem discípulos, batizando-as em Nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo e ensinando-as a observar tudo quanto vos ordenei. E eis que Eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos!” (Mt 28,19s). Isto não é desrespeitar ninguém, desde que o anúncio seja feito sem detratar os outros, sem desrespeitar ou violentar a consciência alheia, sem agredir nem impor: a verdade impõe-se por si, pela sua profundidade, pela sua beleza e harmonia e pelo testemunho pessoal de quem a comunica. No entanto, deixar o paganismo e abraçar o cristianismo é, no dizer de São Paulo, abandonar os ídolos e converter-se ao Deus vivo e verdadeiro, é sair das trevas e ver a grande Luz, que é Cristo, nosso Senhor (cf. Ef 2,1-5; Cl 1,21-23; 2,13ss; 3,5-8).
Um cristão que seja fiel às Escrituras e à constante fé da Igreja, não tem como negar esta realidade: as religiões pagãs trazem, em grau maior ou menor, deturpações na imagem de Deus e do homem e, consequentemente, escravidões. É a escravidão típica do paganismo! A Escritura santa e a própria experiência estão cheias de constatações dessa realidade… O mundo antigo vivia sob a opressão de superstições, da imoralidade, de violência desmedida, do desprezo pela pessoa humana, de opressão e do desrespeito pela consciência. Muitas regiões do nosso planeta, dominadas pelo paganismo, vivem assim! Foi o cristianismo que libertou o homem de tudo isto, revelando-lhe a dignidade de filho de Deus e sua condição de pessoa. Mesmo quando os cristãos não foram fiéis aos princípios evangélicos e também violentaram consciências e até mesmo perseguiram e mataram – e infelizmente, fizeram isto! –, a seiva do cristianismo estava sempre lá, corrigindo as consciências e obrigando os discípulos de Cristo a retomarem, cedo ou tarde, o caminho correto. Por mais que hoje em dia queira-se incutir que todas as religiões são iguais ou que se tem que renunciar a toda obra de difusão do Evangelho, basta escutar com espírito de fé e obediência as Sagradas Escrituras e basta conhecer melhor essas religiões e ver-se-á o quanto de lacunas e erros há nelas. Somente em Cristo é manifestada toda a dignidade do ser humano, pois, como afirma o Segundo Concílio do Vaticano, o mistério do homem somente encontra sua plena luz à luz do mistério do Verbo encarnado… O respeito intransigente que devemos ter pela liberdade religiosa, a liberdade de consciência que devemos defender vigorosamente, o respeito pelas culturas e valores próprios e legítimos de cada povo e pessoa não nos devem jamais perder o foco e esquecer a verdade do Evangelho, seu poder libertador, seu vigor humanizador e o dever que temos de proclamar o Senhor a todos os povos!
Dom Henrique Soares da Costa
Bispo de Palmares
Fonte: Visão Cristã