Palmares, 04 de dezembro de 2024

A morte: de destino a caminho

01 de novembro de 2020   .    Visualizações: 384   .    Palavra do Bispo

Amanhã, nós cristãos, faremos uma pausa nas nossas atividades para reverenciar nossos irmãos falecidos. A Igreja denomina este dia de “Comemoração de todos os fiéis defuntos”.

É um dia no qual nós rezamos principalmente pelos nossos irmãos na fé, os batizados em Cristo que já morreram. Claro que toda a humanidade, não só os cristãos, são objeto da oração e solicitude da Igreja, que é Corpo de Cristo, o Salvador de todos! A Igreja é o Povo sacerdotal e, diariamente, na Santa Missa, recorda não somente os “nossos irmãos que partiram desta vida”, mas também “todos aqueles cuja fé só Vós conheceis”!

O Dia de Finados coloca-nos diante de uma questão fundamental: a questão da morte. Nosso modo de enfrentar a vida depende muito do modo como encaramos a morte, e vice-versa! Atualmente, há quatro modos possíveis de encará-la:

Há aqueles que cinicamente a ignoram. Vivem como se um dia não tivessem que morrer: preocupam-se só com esta vida: comamos e bebamos! Quando vão a um sepultamento, conversam o tempo todo assuntos banais e rasteiros. São pessoas rasas, que nunca pararam de verdade para se perguntar sobre o sentido da vida e, por isso mesmo, não vivem; sobrevivem, apenas! Essas, quando tiverem que enfrentar a própria morte, que vazio, que absurdo encontrarão! É o preço a pagar pelo modo leviano com que viveram a vida! Isto é triste porque quando o homem não pensa na morte, esquece que é finito, passageiro, e, assim, começa a julgar-se deus de si mesmo e tudo que consegue é infernizar sua vida e a dos outros…

Há ainda aqueles que diante da morte se angustiam, apavoram-se até ao desespero. A morte os amedronta: parece-lhes uma insensatez sem fim, pois é a negação de todo desejo de vida, de felicidade e eternidade que cresce no coração do homem. Estes se sentem esmagados pela certeza de um dia ter que encarar, frente a frente, tão fria, tirana e poderosa adversária. Assim, querendo ou não, podem afirmar como Sartre, o filósofo francês: “A vida é uma paixão inútil!”

Há também um terceiro grupo: o dos otimistas ingênuos. Vemo-los nessas seitas esotéricas de inspiração oriental e em todas as doutrinas reencarnacionistas. Afirmam que o mal, a doença, a morte, são apenas ilusão: a meditação, o autocontrole, a purificação contínua, podem libertar o homem de tais ilusões. “A morte não existe. Não há mortos!” – É esta a afirmação existente num monumento ao nascimento do espiritismo moderno. Não há morte para nos agredir; há somente uma desencarnação!

Mas, há o modo tipicamente cristão de encarar a morte. Ela existe sim! E dói, machuca; é uma ameaça real! Não somente existe, como também marca toda a nossa existência: vivemos feridos por ela, em cada dor, em cada doença, em cada derrota, em cada medo, em cada tristeza, até a morte final! Não se pode fazer pouco caso dela: ela nos magoa e nos ameaça; desrespeita-nos e entristece-nos, frustra nossas expectativas sem pedir permissão!

O cristão é realista diante da morte; recorda-se da palavra de Gn 2,17: “De morte morrerás!” Então, os discípulos de Cristo somos pessimistas? Não! Nós simplesmente não nos iludimos: sabemos que a morte é uma realidade e uma realidade que não estava no plano de Deus para nós: não fomos criados para a ela, mas para a vida! Deus não é o autor da morte, não a quer nem se conforma com ela! Por isso mesmo enviou-nos o Seu Filho, Aquele mesmo que disse: “Eu sou a Vida; Eu sou a Ressurreição!” Ele morreu da nossa morte para que nós não morramos sozinhos, mas morramos com Ele e como Ele, que venceu a morte! Para nós, cristãos, a morte, que era como uma caverna escura, sem saída, tornou-se um túnel, cujo final é luminoso. Isto mesmo: Cristo arrombou as portas da morte! Ela tornou-se apenas uma passagem, um caminho para a nossa Páscoa, nossa passagem deste mundo para o Pai: “Ainda que eu passe pelo vale da morte, nenhum mal temerei, porque estás comigo!” Em Cristo a morte pode ser enfrentada e vencida!

Certamente, ela continua dolorosa, ela nos desrespeita; mas se no dia a dia aprendermos a viver unidos a Cristo e a vivenciar as pequenas mortes de cada momento em comunhão com Senhor que venceu a morte, a morte final será um “adormecer em Cristo” que é caminho para o despertar da Glória eterna, da eterna Visão.

Dom Henrique Soares da Costa
Bispo de Palmares (PE)


Fonte: Visão Cistã
Fonte da Foto: Archdiocese off Cincinnati