Palmares, 29 de março de 2024

Coração De Cristo Para O Coração Do Mundo

19 de junho de 2020   .    Visualizações: 801   .    Palavra do Bispo

O mês de junho, o afeto do Povo de Deus cultua de modo especial o Coração do Cristo Jesus. Isto ocorre motivado pela Solenidade litúrgica do Sagrado Coração de Jesus, no segunda sexta-feira após o Domingo da Santíssima Trindade, sempre no sexto mês do ano. Trata-se, esta do Sagrado Coração, de uma belíssima devoção, bíblica, profunda, de forte sentido para a vida cristã. Para não ficarmos numa devoção magra, anêmica, meramente individualista e sentimental, vejamos alguns aspectos mais teológicos desta invocação.

Na antropologia bíblica “coração” indica o interior do homem, a sede de seu caráter, de sua personalidade, ali onde nascem os pensamentos e sentimentos mais profundos. O coração é a sede das decisões do homem, é o seu eu. Dizer “coração” é referir-se ao homem como ser que reflete e toma decisões com conhecimento de causa. Em outras palavras: enquanto nas línguas modernas o coração é sobretudo o órgão dos afetos, na linguagem bíblica, o coração é, principalmente, o órgão do pensamento: dizer que alguém não tem coração é dizer que não tem juízo, que não conhece os próprios pensamentos! No Salmo, o Autor sagrado suplica ao Senhor Deus: “Senhor, mostra-me Teu caminho e eu me conduzirei segundo a Tua vontade. Unifica o meu coração para que ele tema o teu Nome!” (Sl 86/85,11). Sendo o coração órgão da decisão e da vontade, o salmista pede que ele seja unificado para Deus. O sentido seria mais ou menos este: “Unifica-me a mim para Ti: que meus pensamentos estejam em Ti; que minhas decisões e meu modo de viver estejam centrados em Ti e tenham somente a Ti como horizonte, como princípio unificador”.

Se assim é o coração humano, como se manifesta o Coração de Cristo? Seu Coração humano – Ele amou com um Coração humano! – é imagem do coração do Pai, de modo que podemos afirmar que o Coração de Deus se manifesta no Coração de Cristo: “Como o Pai Me amou, Eu também vos amei!” (Jo 15,9). Ora, em toda a Sua inteira existência humana, no Seu ministério, nas Suas palavras, nos Seus milagres, nos Seus encontros com tantas pessoas diversas, nas Suas caminhadas pela Terra Santa, Jesus, nosso Senhor, revelou sempre o Coração do Pai. Basta pensar na parábola do filho pródigo, na qual o Cristo procurou explicar aos Seus adversários que agia com amor e misericórdia porque o Pai faz o mesmo (cf. Lc 15,1)… Portanto, no Coração compassivo, manso e sereno do Senhor Jesus, podemos entrever o quanto Deus é, para nós, ternura e carinho, acolhimento e perdão! A Igreja compreendeu isto tão bem que coloca a seguinte antífona de entrada para a Missa do Coração de Jesus: “Eis os pensamentos do Seu Coração, que permanecem ao longo das gerações: libertar da morte todos os homens e conservar-lhes a vida em tempo de penúria” (Sl 33/32,11.19). É este o pensamento, o projeto, o desígnio incansável e constante do Coração de Deus, manifestado no Coração do Filho Jesus: libertar e dar a Vida, Vida eterna, Vida divina, Vida em abundante plenitude! Contemplar o Coração de Cristo, manso e humilde, rasgado e aberto na Cruz para que recebamos a água que nos vivifica e o sangue que nos lava, significa experimentar, crer e anunciar que Deus, o Pai de Jesus Salvador, é amor e fonte de amor. Este anúncio é tanto mais urgente e necessário quanto mais vemos um mundo, o nosso, ferido, quebrado e seco de coração. Ou não é um mundo machucado pela incredulidade, pela solidão, pela violência, a fome e a pobreza, este mundo nosso? Por mais que os psicólogos tentem, não são eles quem salvarão a humanidade: somente o amor dá sentido a todas as coisas! E amor na medida de Deus, do jeito de Deus, que beba do amor de Deus! E é precisamente isto que o Coração de Jesus revela: que Deus é amor, que Sua paternidade cheia de compaixão e misericórdia abraça todas as criaturas. Do Seu amor ninguém é excluído, do Seu carinho ninguém é esquecido!

Quem dera que este mundo que corre o risco de se tornar sem coração, mundo cão, encontre no Coração de Cristo o descanso, a inspiração e a paz! Quem dera que aceitasse o convite sempre atual e desafiante: “Vinde a Mim, vós todos os que estais cansados sob o peso do vosso fardo e Eu vos darei descanso. Tomai sobre vós o Meu jugo a aprendei de Mim, porque sou manso e humilde de Coração e encontrareis descanso…” (Mt 11,28ss).

Dom Henrique Soares da Costa
Bispo de Palmares


Fonte: Visão Cristã